quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Crônica filosófico-fotográfica da minha viagem a Paris e Amsterdã


Fiz pequenas anotações sobre a viagem, no formato de um diário, e compartilho com vocês juntamente com algumas fotos!


Dia 11/10/24, dia da partida


Nos dias que antecederam, passando em frente a um desses bucólicos cemitérios de São Paulo, eu havia me dito que a viagem seria um momento de refletir sobre a finitude... de enfrentá-la e aceitá-la. 

E eis que de repente, no aeroporto, por indicação de uma amiga, acabei indo à sala VIP da companhia aérea. Sempre de dieta e contido à mesa, me vi tomando muitos drinks e comendo várias sobremesas, celebrando a
vida!

Começava bem a viagem.


Dia 12, sábado 



Cheguei a Paris cansado, desanimado. O céu estava escuro e a cor do Sena horrível. Só melhorei com um vinhozinho no final do dia, no café Luna, pertinho do meu hotel em Montmartre. 


Estava lendo sobre Spinoza (ou Espinosa), que teria um papel importante na viagem. Troquei mensagens reconfortantes com os meus no Brasil. 




Dia 13, domingo 


Nas minhas viagens, gosto de "fazer", e não só de "ver" coisas. Gosto de museus, mas não da “musealização” do mundo, expressão usada por Byung-Chul Han num de seus livros. 

Então fui fazer meu Cooper (a expressão é antiga!) e descobri, com a ajuda da internet, o maravilhoso Parc Monceau. Estava a duas estações de metrô, pela linha 2. Acho que voltei lá quatro vezes para correr, sempre entusiasmado. 

Depois fui andar pelo bairro de Montmartre. Já tinha ido outras vezes, mas com o passar do tempo nosso olhar vai se apurando e nos tornamos mais capazes de admirar o belo. O atendente de uma galeria de artes, que vendia também livros e cartões postais antigos, foi extremamente caloroso comigo.



Dia 14, segunda


Na segunda, fui cedo ler e escrever na Biblioteca Mazarine, à beira do Sena. Já tinha ido lá em novembro de 2019, quando estava fazendo meu pós-doutorado. É um lugar maravilhoso!







A tarde me reservava uma grande descoberta. A abadia de Port Royal, que fica no Boulevard Port Royal, na rive gauche. A abadia foi sede do jansenismo no século XVII e era frequentada pelo filósofo Blaise Pascal, que apoiava o movimento. 


Dia 15, terça 

Voltei para ler na biblioteca Mazarine e depois andei pela rua Saint-André des Arts, onde comi um crepe gostoso, de massa um pouco mais grossa e escura, como é a especialidade da Bretagne (uma "galette"). 

À tarde fui conhecer a livraria FNAC de Montparnasse e comprei muitos livros!

A foto é do metrô de Paris, do início do dia. Sou maravilhado com ele. Tem para mim até um cheiro peculiar, bom, que associo à França e às minhas primeiras viagens. Como se fosse a madalena de Proust... 





Dia 16, quarta

Foi o dia do Louvre, cujo ingresso eu tinha comprado com bastante antecedência. Meu olhar fica meio tenso, como se eu não fosse capaz de absorver tanta beleza. 

Dessa vez, consegui aproveitar bastante, pois almocei por lá e tive forças para esticar a visita no período da tarde, vendo mais algumas salas de antiguidades gregas e também quadros de pintores franceses.

Sempre digo e repito aqui para os mais jovens. Para aproveitar um museu como o Louvre, é preciso conhecer um pouco da mitologia grega!

As fotos são de Afrodite, sempre inspiradora, e de um leão romano de basalto negro. 



Dia 17, quinta 



Fui feliz para Amsterdã, saindo da Gare du Nord. Desafiar-se é sempre bom e excitante, e viajei animado para um encontro com Spinoza, que nasceu e viveu na Holanda. 

No primeiro dia, fiquei um tanto tenso, pois não conhecia bem o país. Aí parei para tomar essa deliciosa cerveja. O garçom, um negro bem humorado, com um vozeirão de Louis Armstrong, parece ter lido meus pensamentos, pois me disse com muita ênfase: "Re-lax! We are in Amsterdam!” 






Dia 18, sexta

No programa da viagem, era o dia de ir a Rijnsburg, cidadezinha onde Spinoza havia morado quando saiu de Amsterdã. Sua casa foi transformada num pequeno e belo museu. Peguei um trem para Leiden e de lá um ônibus. Fui acompanhado na visita por um senhor muito gentil. 


Em algum momento, ele me deixou sozinho no gabinete de trabalho de Spinoza, onde o filósofo havia gestado a "Ética". Senti como que a gravidade e a solenidade do momento.

Um biógrafo dele, Johannes Colerus, seu contemporâneo, diz que, apesar de suas teses consideradas heréticas, o filósofo gostava muito de determinado salmo da Bíblia. Eu havia decorado o salmo quando li em francês essa biografia e na hora o recitei com alguma devoção, não sei se religiosa ou filosófica: 



L’Éternel est près de tous ceux qui l’invoquent, de tous ceux qui l’invoquent avec sincérité. (O Eterno está perto de todos os que o invocam, de todos os que o invocam com sinceridade. 145-18)






Dia 19, sábado

Foi o dia de visitar o Rijksmuseum, o Louvre de Amsterdã, digamos assim. A visita foi excelente. Comi no café do museu uma deliciosa torta de maçã com chantilly! 


E destaco na foto um quadro de Fran Post retratando uma paisagem de Olinda/PE no século XVII, quando os holandeses dominaram uma parte do nosso território. 






Não dei sorte com os transportes dentro de Amsterdã e acabei caminhando demais, fazendo várias vezes o percurso entre meu hotel e a estação "Amsterdam Centraal". 

Cansado do mundo nórdico, voltei satisfeito a Paris. 





Dia 20, domingo


O domingo em Paris foi excelente e começou com uma bela corrida em Montmartre! 


Depois encontrei a querida amiga Tânia Marangoni e fizemos um passeio maravilhoso pela rive droite, região chique de Paris onde eu não costumava ir. 

Tânia me apresentou a bela "Galerie Vivienne", nas imediações do jardim do Palais Royal, que data do início do século XIX e é mencionada pelos escritores da época.



Dia 21, segunda

Essa segunda, quase no final da viagem, foi muito especial. Pela manhã estive em várias livrarias. Ao todo durante esses dias comprei cerca de 45 livros, que pretendo ler, pelo menos parte deles, até o final do ano que vem!


À noite, fui à Comédie Française assistir à peça "Le malade imaginaire" (O doente imaginário), de Molière. Eu havia me preparado e lido a peça há algumas semanas, o que facilitou a compreensão. Para comemorar, tomei um champagne antes do início do espetáculo, sob o olhar complacente do dramaturgo.




Dia 22, terça



Último dia antes do voo de volta para o Brasil. Finalmente fui conhecer o Museu Carnavalet, no Marais. É belíssimo, com um acervo impressionante. Pude aumentar meus conhecimentos sobre um tema que sempre gostei de estudar, a Revolução Francesa e as revoluções do século XIX na França. 




Na foto abaixo, o quadro famoso que retrata o juramento que os deputados do Terceiro Estado fizeram em 1789, de que não se separariam até dar uma Constituição à França. (Le Serment du Jeu de Paume)

Quase uma foto do Big Bang, do momento exato em que os deputados, que não haviam sido convocados para isso, alçaram-se à condição de Poder Constituinte Originário, apoiados nas ruas pelos "sans-culottes".


 

Dia 23, quarta

Dia do retorno. Precisava sair do hotel por volta de 10 horas da manhã, em direção ao aeroporto Charles De Gaulle. Mas consegui ir cedinho de metrô ao Parc Monceau e fiz uma última corrida. Ainda estava de noite quando cheguei ao parque, apesar de já ser 7 horas. 

O taxista que me levou ao aeroporto, haitiano que mora há 22 anos na França, tem mulher e filhos, foi extremamente gentil e batemos um ótimo papo, inclusive sobre a política francesa e a questão da imigração. 


Já no aeroporto, depois do check-in, tomei tranquilo um café no “Paul”, celebrando a viagem proveitosa e sem contratempos!




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